quarta-feira, 16 de junho de 2010

Eneida - Virgílio

Editora: Martins Fontes

ISBN: 978-85-336-2060-5

Tradução: José Victorino Barreto Feio e José Maria da Costa e Silva

Opinião: ★★★☆☆

Páginas: 449

Sinopse: Obra de Púbio Virgílio Marão, que ficaria conhecido como Virgílio, foi o modelo de toda a poesia que se escreveu no Ocidente até o século XVII. Os gêneros cultivados por Virgílio foram tomados de empréstimo da literatura grega, mas ele imprimiu à sua poesia uma marca pessoal e inconfundível, derivada de sai sensibilidade artística e da maestria com que trabalhou seus versos. Camões, Tasso, Milton e todos os grandes poetas épicos dos séculos XVI e XVII são virgilianos. Sua maior obra, a epopeia Eneida, foi projetada durante os anos 29 e 27 a. C. e é considerada o maior poema da romanidade.


 

“Pois dentro do espaçoso templo, enquanto

Cada cousa per si passa em resenha,

Aguardando a rainha, enquanto admira

Qual a fortuna seja da cidade,

Dos artistas as mãos rivalizando

Entre si, e das obras o trabalho,

Por ordem vê pintadas as pelejas

De todas a guerra Ilíaca, por fama

Já pelo mundo inteiro divulgadas.

Príamo, e o filho vê d’Atreu, e Aquiles

Para com ambos eles implacável.

Para absorto, e co’as lágrimas nos olhos,

Acates, disse, que lugar no globo,

Que região existe, que já cheia

Dos nossos infortúnios não esteja?

Eis Príamo: a virtude aqui seus prêmios

Tem, a desdita lágrimas, e aos males

Da humanidade as almas são sensíveis.

Desvanece os temores: esta fama

Alguma salvação há de trazer-te.”

 

 

(...) “Meus próprios males

Me ensinaram a ser compadecida”.

 

 

“Que sonhos indecisa, Ana, me aterram!

Que novo hóspede entrou em nossa casa!

Quão gentil! de quão forte peito e braço!

Qu’é progênie dos deuses, creio, e certo

Não creio em vão. Temor vileza indica.

Ai, quanto o hão perseguido adversos fados!

Quantas batalhas conta pelejadas!

Se n’alma fixo e imoto eu não tivesse

Em laço conjugal não mais unir-me

A homem algum, depois qu’o amor primeiro

Com a morte falseou minha esperança;

Se do tálamo tão aborrecida,

E fachos de Himeneu, não estivesse,

Talvez a esta só culpa eu sucumbira.

Ana, (o confesso enfim), depois do infausto

Destino de Siqueu, mísero esposo;

Depois que ensanguentou irmão cruento

Com assassínio atroz nossos penates,

Este só atraiu os meus sentidos,

Meu ânimo impeliu, prostrou de todo:

Reconheço os sinais da antiga chama.

Mas antes se abra a terra e nos abismos

Me sepulte, ou o padre omnipotente

Co’um raio às sombras e profunda noite,

Ó santa Pudicícia, qu’eu te ofenda,

Ou chegue a violar os teus preceitos!

Aquele que me uniu a si primeiro,

Esse levou consigo os meus amores:

Ele os tenha, ele os guarde no sepulcro!

Disse, e banhou de lágrimas o seio.”

 

 

“Aonde, ó Fábios, me levais cansado?

Tu, Máximo, és aquele que nos salvas

A República só temporizando.

Com mais brandura os respirantes bronzes

Fundirão outros, não duvido, e vultos

Farão surgir do mármore animados;

Terão mais eloquentes oradores,

As voltas mostrarão do céu co’a vara

E dirão por que modo os astros surgem.

Tu, Romano, a reger co’o império os povos

Te aplica: estas serão as tuas artes:

E impor as leis da paz, aos submetidos

Perdoar clemente, e debelar os soberbos.”

 

 

“Os Enéades súbito turbados

O odioso semblante reconhecem

E os membros giganteus! Então de um salto

Pândaro ingente avança e ardendo em ira

Pela fraterna morte: “Não é este

O palácio dotal (lhe diz) de Amata,

Nem Árdea te contém dentro em seus muros.

Estás em campo imigo e tem por certo

Que com vida escapar te é impossível.”

Com sorrir desdenhoso lhe responde

Turno: “Se tens denodo, principia,

Vamos às mãos, que a Príamo irás breve

Contar que novo Aquiles deparaste.”

Disse, e Pândaro logo uma haste rude

Ainda com os nós e a casca crua

Com quanta força tinha lhe dispara:

Recebe o vento o golpe, que a Satúrnia

Juno, dos céus baixando, lh’o desvia,

E a hasta na porta se cravou tremendo.

“D’esta lança que o braço meu te vibra

Agora tu não fugirás por certo,

Que da lança e do golpe o autor é outro.”

Disse, e co’a espada erguida se prolonga,

Com desumana cutilada o colhe

Por entre as fontes e as imberbes faces,

De meio a meio fende-lhe a cabeça.

C’o baque e peso ingente o chão se abala,

Já pela terra lânguidos os membros

E do cérebro as armas salpicadas

Morrendo estira; em duas metades

A cabeça lhe pende dividida.”

 

 

“Por que o silêncio a quebrar me obrigas?

E a concentrada dor mostrar com vozes?”

 

 

“A fortuna é de audazes”.

 

 

“Mal que de longe os batalhões turbando

Purpúreo no cocar, purpúreo em roupas,

Dom da noiva, Mezêncio o vê em guisa

De faminto leão, que, estimulado

De apetite frenético, mil voltas

Já dera em torno de um curral, se acaso

Veado alticornígero descobre,

Ou fugaz cabra, as fundas fauces abre,

Ouriça as jubas, fica-se estendido

Da presa sobre as vísceras e lava

Em negro sangue os truculentos beiços;

Assim o audaz Mezêncio se arremessa

Dos inimigos no esquadrão cerrado.”

 

 

“Já o féretro e grades outros tecem

De vergônteas e de roble e arbúteas varas

E o pronto leito de folhagem cobrem.

Sobre esta agreste cama o moço estendem,

Qual flor colhida por virgíneos dedos

De branda viola, ou lânguido jacinto

De quem inda o fulgor, inda a beleza

Não fugiram de todo, bem que a terra

Já forças lhe não dá, nem dá sustento.”

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